Há algum tempo atrás minha resposta seria cheia de floreio cor-de-rosa e uma carga extra de egoísmo. O excesso da necessidade de reciprocidade. Hoje, tenho a audácia de discordar de Martha Medeiros quando ela diz que ‘o sentimento mais bonito é o sentimento correspondido’. Não Martha. O amor pra ser bonito não precisa receber amor de volta. O verdadeiro, que faz parte do sublime, da entrega verdadeira. É o bem-querer sem expectativa. O amor livre.
Livre para amar... e só. Sem precisar de atenção, presença. Aquele amor que faz a gente dar a vida por quem não nos daria sequer um bom dia. Sim, existe. Eis o exemplo dos pais!
Existe amor mais perfeito entre os seres viventes que o amor de uma mãe ou pai para um filho? O amor incondicional. Para um pai ou uma mãe a felicidade e o bem estar de um filho estão acima de qualquer interesse. Entre vê-lo feliz na Austrália e tê-lo frustrado a seu lado, eles não tem dúvidas em que optar. Se um filho erra 300 vezes, os pais perdoam 301. Sabem que os filhos não os pertencem. Mas o amor que sentem, sim.
Não deu certo na Austrália... mas os pais o recebem de volta. Numa discussão, de onde podem sair mágoas, os pais perdoam. Perdão é amor. Casos que pais e filhos rompem por anos e nunca, jamais deixam de amá-los. Criam com todo o afinco e num ato ímpar de generosidade, entregam o filho para viver com outra pessoa... desprendimento é amor. O melhor presente é sempre para ele. Querem vê-lo progredir, ensiná-lo a viver. A saudade é insignificante perto da alegria em ver a realização de um filho. E se somos capazes de amar dessa forma a um filho é porque temos capacidade plena para exercer esse sentimento com quem quer que seja.
Amor é isso, abnegação, resignação. É ter paciência, tolerância. Perdoar e receber de volta quantas vezes forem necessárias. Ser admirado pelas atitudes, a troca é consequência. Acho um pouco cruel essa segmentação do sentimento: amor de irmão, amor de amigo... amor é amor! É mais que querer estar junto, é querer a felicidade do outro, do nosso lado ou não. O desejo de possuir dá lugar à vontade de querer o bem. Que seja feliz, longe ou perto, mas que seja feliz. Isso é, de longe, o sentimento mais maravilhoso que eu conheço.
Acredito que seja um exercício que, como aquele da academia, no começo é bem difícil e dói um pouco. Mas depois de um tempo se torna tão natural que a gente sente falta quando não pratica. A abstenção da necessidade de posse é uma libertação. Desintoxica a alma e economiza rugas. No amor livre, assim como um pai pode esperar uma vida pelo filho, nós podemos esperar vidas pelo nosso amor, porque a gente ama, pura e simplesmente, como parte do cotidiano. E se um dia tivermos o privilégio de receber esse amor de volta, depois de tanto exercício, o coração estará bem mais saudável para acelerar o ritmo e bater mais depressa.