segunda-feira, 20 de maio de 2013

Começo


Naquela noite gelada me dei conta do tamanho do amor que eu tinha por aquele cara. E do tamanho da encrenca que tinha me metido.
Madrugada, eu e os lençóis amassados, tamanha pressão dos meus dedos pela angústia de não conseguir negar. Eu tava ferrada. Absoluta e encantadoramente apaixonada por aquele moço dos cabelos macios.
O lance de curtição não alimentava mais. Eu queria ele pra mim. Mas essa bendita fase da pegação é muito complexa.
A gente tem certeza que o cerco fechou quando tudo é bonito. E nele tudo era. Um corpo onde todo centímetro foi cuidadosamente moldado pela beleza. Até o silêncio dele era bonito... a mudez dos olhos dele me olhando era embriagantemente linda.
E os dias passaram a ter poesia sem razão. O cheiro da poluição, a luz queimada do poste... o lirismo tomou conta até das bolhas dos pés machucados pelo sapato novo. Tudo bem cafona, mas doce e verdadeiro.
Ele colocou delicadas rimas nos meus dias. E eu, a mais individualista das almas, comecei a ver sentido em dividir o cobertor. Quando necessário, aliás. Porque nosso emaranhado de corpos aquecia o suficiente. E as noites geladas não petrificavam mais. Pelo menos, não nos finais de semana. Havia um acorde harmônico ali que era viciante.
De repente me peguei fazendo rima com os dias a espera do meu cobertor vivente. A cada segunda-feira. E de novo. Sempre da forma mais estúpida, poética e apaixonada possível.
Um brinde aos poetas estúpidos e apaixonados. Tô bem feliz com isso.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Tirando a poeira

É como se aqui fosse uma folha velha. Um papel encardido e empoeirado que aos poucos se embeleza com a cor do tinteiro. Umas passadas firmes com a mão pra retirar o excesso de tempo e as pautas vão revelando um charme que só a experiência é capaz de dar. E quanto vivem as pautas da nossa vida.
E o tempo vivido me dá liberdade de fazer o que for com as letras, com a poeira, comigo. Posso dizer que o tempo me ensinou a sem-vergonhice que emagrece os quilos da responsabilidade. 
Quando se tem um pouco de poeira nas costas, meu caro, não se dá tanta importância a corretismos ou baixezas. A aspereza do pó faz qualquer traço de atitude sair mais leve. A gente já não marca as folhas como no colégio. Ficavam fundas do outro lado, lembra? Não, agora não... agora o punho desliza sujando um pouco do dorso que detalha as sutilezas, a simplicidade. O realismo dos momentos que também diminui a paciência com gente aparentemente limpa demais, que tudo ama, tudo critica, tudo se abstém. Gente escrota precisa de um pouco de pó da vida pra conviver em sociedade. 
Um pouco de poeira humaniza a história da gente.